quarta-feira, 16 de maio de 2007

O ócio de Maria Helena

Maria Helena leva uma vida inútil. Sentada no banco da parada de ônibus pensa porque mora naquela cidade, pensa um pouco mais e sente sono. Que droga de vida. O ônibus demora tanto. Por um segundo pensa que ficará ali até seu ultimo dia, esperando. Olha pro lado e vê uma criança magra, negra e triste. Sente vergonha de achar sua vida uma droga. O mundo é nojento em deixar alguém tão pequeno se acabar aos poucos. Que droga de mundo.

Quando chega em casa não sabe o que fazer. Pensa no quanto seria legal ir a uma festa, beber até ficar descontrolada, fumar três carteiras de cigarro. Conversar, beber e fumar até a voz sumir. Só que não dá, não há nenhuma festa. E festa legal desse jeito só acontece em seus pensamentos. Seus amigos estão ocupados, não há pra quem ligar. Todos estão fazendo alguma coisa diferente, mas o objetivo é o mesmo: ganhar dinheiro. Isso também faz Maria Helena sentir nojo, mas ela entende. Pensa que pra ir a uma festa legal seria necessário muito dinheiro. “É, acho que preciso de um emprego...”, sonha.

As horas vão passando. A TV tá ligada, mas tudo é ridículo demais pra prender a atenção de Maria. Ela não sente vontade de escutar música, não naquele momento. As leituras não interessam, ela não quer aprender, só queria ocupar o tempo com algo agradável, mas que não exigisse absolutamente nada dela. Maria Helena sente sono. Por um momento olha pra TV com um pouco mais de afinco. Está passando um programa de auditório cujo apresentador é um psicólogo esforçado em resolver um “grave” problema de sua paciente que chora excessivamente na frente da platéia e das câmeras. Seu problema parece comover a todos, mas Maria Helena ainda não sabe do que se trata até prestar atenção na tarja na parte inferior do televisor: “Mulher sofrida confessa:’Não consigo segurar gases em nenhuma situação’”. Maria Helena ri sozinha, nunca viu nada tão ridículo em toda sua vida. Não consegue entender porque alguém iria a programa televisivo expor um problema tão constrangedor como este. “Isso só pode ser uma armação. Só pode ser!”, indigna-se. Depois de tal absurdo não há outra saída. Maria Helena vai dormir.

Na cama, olha pro teto. O ventilador faz um barulho repetitivo e isso a incomoda muito. Mas ela sempre dormiu com aquele barulho. Porque agora ele parece tão estrondoso? Na sua cabeça mil coisas supérfluas ganham vozes. Ela demora três horas pra pegar no sono. Mas antes de dormir ela lembra com tristeza que amanhã será a mesma coisa. E foi.

8 comentários:

Raoni Holanda disse...

primeiro: rasgação de seda - obrigado pelo seu comentário em meu pequeno blog, me faz querer escrever mais. segundo: gostei da cara de seu novo blog, ganhou mais personalidade e parece mais com vc; embora o blogspot seja bastante limitado existem muitas possibilidades para ultiliza-lo o nós raramente as descobrimos. quero ler mais textos seus...

Fausto Suzuki disse...

Vou tentar manter um desses, será que consigo?

Anônimo disse...

Oi Luiza, gostei do seu blog. Tava lendo o que vc falou do Henry Chinasky, vi um filme sobre ele mês passado. Mto legal. Parabéns

O principe da classe operária disse...

Prefiro a Maria Helena ao Henry...não sei se o motivo é que dá pra encontrar uma pessoa dessas em cada parada de onibus ou( o motivo mais facil) eu acabo não indo muito com a cara do Henry e tambem adoro nomes que comecem com Maria

Anônimo disse...

Eu também fico com a Maria Helena...
Eu também gosto de como escreves.
Eu estou meio que na clausura, por isso não tenho saído muito.
Mas podemos nos "ver" por aqui.
Beijos!

arghlemonster disse...

...classe DETECTADA aqui. Viva a cultura BEATNIK.

Anna Beatriz disse...

Lú,muito bom o que você escreve, na verdade você é foda amiga, incrivél mesmo...

Paulozab disse...

Já falei pro Fausto e vou falar pra ti também: Escrever também vicia!